Surdez de transmissão
Autores: Diane Lazard, Benjamin Chaix
Ayuda a la realización: Michel Mondain, Frédéric Venail, Nuno Trigueiros-Cunha
Numa hipoacusia (surdez) de transmissão a diminuição da acuidade auditiva é causada por uma patologia do ouvido externo ou do ouvido médio. Neste capitulo abordam-se, de forma não exaustiva, as causas mais comuns.
Patologia do ouvido externo
Patologia do ouvido externo
Sintomas : Dor (otalgia), escorrência de pús ou sangue (otorreia / otorragia) e surdez.
Exame clínico e etiologia :
Patologias do pavilhão auricular : caracterizam-se por modificação do aspeto da pele da orelha e otalgia.
- Origem cutânea : eczema, psoriase, furúnculo, micoses.
- Origem traumática : hematoma do pavilhão (otohematoma). Se não for corretamente tratado a orelha fibrosa e deforma-se = orelha em couve flor.
- Infeção da cartilagem (condrite): pele quente, ruborizada e com lesões ( vesículas, pús,…). O risco é a destruição da orelha. Atenção aos piercings na cartilagem, a principal causa de condrites (imagem).
A perda de audição é devida a um obstáculo mecânico do canal auditivo externo (edema, exsudados, …)
Patologias do canal auditivo externo :
- Rolhão de cerumen : A surdez de transmissão mais frequente. Pode ainda desencadear otalgia e sobreinfeção (otite externa).
- Otite externa (inflamação da pele da canal auditivo) : Causa otalgia intensa, otorreia, descamação (imagem).
A perda auditiva deve-se ao obstáculo mecânico do canal auditivo externo ( rolhão de cerumen, exsudados)
A surdez da transmissão com origem no ouvido externo não ultrapassa os 30 dB de perda.
Patologias do ouvido médio
As hipoacusias com origem no ouvido médio classificam-se em duas categorias: hipoacusias de transmissão com membrana timpânica anormal e as hipoacusias de transmissão com membrana timpânica normal. Ambas as categorias partilham as características acumétricas e audiométricas seguintes (ver o capítulo dedicado à exploração funcional) :
- Weber lateralizado para o ouvido surdo e Rinne: Condução aérea (CA) < condução óssea (CO).
- Diminuição da CA , CO normal.
- Abolição do reflexo estapediano.
- Audiograma Vocal : deslocação para a direita da curva mas atingindo os 100% a intensidades mais elevadas. A curva mantém a forma sinusoidal normal.
Hipoacusias de transmissão com membrana timpânica normal:
O que é uma membrana timpânica normal?
Uma membrana timpânica normal é fina e transparente, permitindo observar o ar da cavidade timpânica. O martelo é o único ossículo que contacta a membrana timpânica.
Observe membrana timpânica apresentada à direita com o martelo (1), o triângulo luminoso refletindo a luz do otoscópio (2), o orifício da trompa auditiva (3) e a pars tensa (4) através da qual é visível o promontório.
Otosclerose
Sintomas: hipoacusia, +/- acufenos e vertigens.
A otosclerose é causada pela anquilose estapedovestibular: diminuição da mobilidade da articulação entre o estribo e a janela do vestíbulo. É uma surdez adquirida (aparece no adulto) de origem genética autossómica dominante com penetração variável. É uma doença evolutiva que acaba por atingir o ouvido interno provocando surdez neurossensorial e vertigens (labirintização).
O tratamento é cirurgia ou a utilização de prótese auditiva
Sequelas de traumatismo craniano
Um traumatismo craniano pode provocar luxação ou fratura dos ossículos do ouvido médio, sem efeito neurossensorial (sem lesão do rochedo e do labirinto).
Sintomas: hipoacusia, otalgia e raramente paralisia facial (por compressão).
Hipoacusia de transmissão no audiograma e acumetria. A impedâncimetria apresenta aumento da compliance e, dependendo da localização de disjunção, pode existir alteração dos reflexos estapédicos ipsi ou contralaterais.
O diagnóstico é confirmado pela tomografia computorizada.
O tratamento é cirúrgico através de realização duma ossículoplastia
Malformações da cadeia ossicular (aplasias menores)
Prevalência: 10 por 20000 nascimentos. A lesão pode ser bilateral em 30 a 40% dos casos. A malformação dos ossículos pode, por vezes, ser acompanhada por anomalia do pavilhão auricular e/ou do canal auditivo. O ouvido interno é habitualmente normal.
Sintomas: hipoacusia de transmissão.
O diagnóstico é realizado pela tomografia computorizada.
O tratamento é cirúrgico ou protésico.
Hipoacusias de transmissão com membrana timpânica anormal:
Otite média aguda : infeção das cavidades do ouvidomédio que se encontram cheias de pús.
Sintomas: otalgia, fébre e hipoacusia.
Muito frequentemente de origem bacteriana, mas também vírica.
É principalmente uma doença da criança com menos de 2 anos, mas pode ocorrer em todas as idades.
Necessita duma consulta rápida pois pode-se complicar com a extensão da infeção para as cavidades posteriores: mastoidite. Apresenta risco de meningite, abcesso cerebral e trombose do seio lateral.
No tratamento da otite média aguda é frequente praticar uma paracentese (miringotomia) para diminuir a dor e a febre e colheita de material para microbiologia como objetivo de adaptar o tratamento antibiótico.
Observe este tímpano esquerdo que apresenta uma otite média aguda: a membrana timpânica está espessada, opaca, tufada (abaulada) e apresenta uma hipervascularização evidente. O triângulo luminoso desapareceu. O martelo é menos visível e o seu cabo cria uma depressão no seu local de inserção. É possível observar pus no ouvido médio através da membrana timpânica (cor amarela).
Otite média com efusão (seromucosa) : presença de líquido assético nas cavidades do ouvido médio. Esta patologia é causada por uma disfunção tubar que provoca alteração do arejamento da caixa do tímpano.
Sintomas: hipoacusia, otalgia ligeira e pressão no ouvido.
É muito frequente na criança entre os 2 e os 4 anos, mas ser encontrada nos adultos. Um dos tratamentos é colocação de tubos de ventilação transtimpânicos (ver imagem).
Atenção no adulto: excluir a presença dum tumor da nasofaringe.
Sequela de otite média com efusão : esta imagem mostra uma membrana timpânica direita que se encontra atrófica (muito fina) e globalmente retraída (medializada), originando uma atlectasia (diminuição do volume da caixa do tímpano) .
Observe a retração da membrana timpânica a nível da pars flácida (1), o relevo exagerado do martelo pois é moldado pelo tímpano retraído (2) e a aderência da membrana à longa apófise da bigorna (3). A retração da membrana timpânica também é visível ao nível da pars tensa (4).
Otite média crónica simples (perfuração timpânica):
Sintomas: hipoacusia (< 30 dB se isolada), por vezes associada a otorreia purulenta esporádica.
Características otoscópicas: perfuração central (que respeita o ligamento anular, que é a zona de inserção da membrana timpânica).
Tratamento cirúrgico possível: encerramento da perfuração (timpanoplastia).
Se a hipoacusia é > 30 dB deve procurar-se uma lise ossicular ou fixação da cadeia.
Bolsas de retração e otite média colesteatomatosa :
Sintomas : hipoacusia, +/- otorreia
A otite média colesteatomatosa é consequência de otites na infância. É uma doença evolutiva do ouvido médio que destrói todas as estruturas adjacentes. A evolução é lenta mas potencialmente grave (meningite, abcesso cerebral, paralisia facial, etc.). Geralmente, o estadio inicial é a bolsa de retração. Esta bolsa de retração pode evoluir para um colesteatoma (verdadeiro tumor epitelial benigno mas muito agressivo, de crescimento lento e que destroí as estruturas do ouvido médio e até do ouvido interno, nos estadios avançados).
Características otoscópicas : Perfuração marginal ou da pars flácida que destrói o ligamento anular e os limites ósseos de inserção do tímpano. De facto, não se trata duma verdadeira perfuração, a membrana timpânica mantém-se contínua mas é aspirada para o interior da caixa ou para o ático.
A otite média colesteatomatosa é caracterizada por acumulação de escamas de queratina na bolsa de retração. A lise ossicular é clássica e é frequente a labirintização (lesão do ouvido interno), que se traduz por uma surdez mista (CA e CO diminuídas). Na maioria dos casos o tratamento é cirúrgico.
Otite fibroadesiva:
Sintoma : hipoacusia
É uma doença inflamatória da caixa do tímpano e da membrana. Nesta doença verifica-se a fusão entre a mucosa da parede medial da caixa do tímpano e a da membrana timpânica por tecido conjuntivo inflamatório que provoca a atlectasia do tímpano.
Características otoscópicas: membrana timpânica atlectasiada, que pode apresentar um aspecto espessado e opaco ou atrófico e aderente á parede medial da caixa, sem que sejam individualizados os ossiculos.
Evolui para uma surdez mista.
Não é possível oferecer resultados satisfatórios quer com tratamento médico quer com